domingo, 28 de agosto de 2011

Marreco 16, um Anão de Oceano

Velejada na Lagoa de Marreco - Relato do Comte.Newton
Depois de dois meses, sem navegar em função do meu coração meio pipocando, resolvi aceitar o convite do Octaviano grande amigo e tripulante do Colibri para trazer um marreco 16 de Porto Alegre a Rio Grande. Convite esse aceito na hora sem titubear, pois eu adoro esses barquinhos muito marinheiros e doceis, valentes para o mar . Octaviano acertou o negócio e ficamos de ir a Porto Alegre na segunda-feira, dia 15 de agosto. Chegando em Porto Alegre fomos direto para o barco do amigo Duduca no Iate Clube Guaiba, o veleiro Minuano ,onde ficamos acomodados até a conclusão da compra do barco. Na terça -feira, dia 16 ficou todo comprometido com as arrumações para navegação. Levamos o dia todo fazendo as coisas necessárias para aprontar o veleiro. O barco estava no Clube Jangadeiros, eram mais ou menos umas dezessete horas, quando saímos do clube em direção ao Iate Clube Guaíba com um ventinho bom de nordeste .O motor funcionou cem metros e não "quis" mais nada, mesmo tendo sido feita uma revisão pelo mecânico do Jangadeiros... pelo menos foi isso que ele falou e me disse, que barco a vela anda a vela não a motor... só lhe retruquei, que de Porto Alegre a Rio Grande tem umas boas milhas para se fazer. Resumindo, só consegui acertar esse motor no Clube Náutico Itapuã, depois de verificar as coisas que esse mecânico estragou em vez de consertar; mais dois dias comprando algumas coisas e finalmente saímos na quinta feira, às nove e trinta do Iate Clube Guaíba com o tempo nos brindando com um belo chuvisco e uma aragem de leste.
Conseguimos levar o motor trabalhando mal até perto da ilha Chico Manuel, depois não deu mais, por sorte entrou um leste mediano que nos levou até o morro do Côco, onde resolveu despertar a sua fúria e começou a soprar forte. Tiramos a genoa e o barco continuou andando na mesma velocidade; me impressionou a maneira que se comportava e orçando bem,em seguida precisamos rinzar a grande e continuou andando igual, subia e descia na onda, que valente esse anão oceânico.Chegamos no Clube Naútico Itapuã todo molhados, mas felizes por saber que o Octaviano tinha comprado um belo barco. Beleza, a lagoa não seria problema para esse barquinho, me inspirou muita confiança apesar de seu tamanho. Chegamos no clube eram umas dezessete horas e pouco depois o vento amainou, nem parecia que estava aquela "porrasca" de vento .
Fomos muito bem recebidos pelo pessoal do clube, gente boa e de bom coração .Fizemos belas amizades ,como a do Marino comandante do Bagual II, o Luiz Marasca e a Lia comandante do Tobruk. O Lála figura ilustre do clube... lá da vontade de ficar pelo menos uma semana só para conviver com esse pessoal maravilhoso .O Bira comandante da lancha Kabang. A Tina que chegou no Liberdade com seu flamante motor recondicionado e nos trinques, iriam para a Lagoa do Casamento com uns amigos .Legal mesmo é o mascote do Clube Itapuã o Crok Crok, uma garça, que vive livre e acompanha o pessoal pelo trapiche... a preguiçosa agora conta com peixe fresco que o pessoal pesca para alimentá-la, não quer mais nada o bichinho... só vida boa!
Tivemos que esperar três dias por uma janela, pois a coisa enroscou de vento e encheu a água acima dos trapiches do clube. Nós estávamos sempre com a previsão da Maria Teresa (Tete) a qual queria participar de qualquer maneira... até o último momento ficou enlouquecida para ir, mas seria muito ruim para ela pela pouca acomodação do barco .
Então a convenci de pegar vários pré-tempos e formar a previsão ,e nos passar as melhores janelas e foi perfeito. Graças a ela fizemos ao pé da letra as etapas, ela nos deu a pré para sair do Naútico Itapuã ao Cristovão Pereira direto. Teríamos ventos sul e suleste calmeirinho, então era tocar motor e vela para atravessar a lagoa, pois iria enroscar de leste suleste na terça mas ai estaríamos com abrigo de costa até passando o São Simão foi calmaria e só tinhamos que cuidar para não bater nos tocos e pedaços de árvores boiando na lagoa. Eu nunca tinha visto tanta árvore boiando na lagoa, bastante perigoso... isso só melhorou a partir do São Simão onde também entrou um ventinho de suleste e começou a puxar, mas o barco com tudo em cima rendia bem e chegamos ao pé do Cristovão Pereira eram vinte e trinta horas com uma escuridão total, o farol está só para bonito e a boia na ponta do banco também, não vimos luz nenhuma não duvido que esta boia esteja navegando por ai sem rumo .Falei para o otaviano que quando amanhecesse o farol estaria ali bem pertinho, dito e feito amanheceu com o farol em cima .
Tomamos um bom café, colocamos a roupa de chuva pois chovia e o vento era forte, mas graças a Deus estávamos do lado do abrigo de costa e ai ia render bem .Saimos junto a costa e fomos costeando até perto do farol do Capão da Marca, sem ondas e um ventinho amigo dava uma orça cochada. Do Capão da Marca fizemos rumo do Bojuru ,ai teve um pouco de onda mas o barquinho tira de letra e pela Tete poderíamos ir até a Barra Falsa onde chegamos às dezoito horas. Dali pegamos mais uma previsão onde teríamos ventos médios até as dezoito horas, depois iria enroscar forte com rajadas de trinta a trinta e cinco nós.
Fizemos o mesmo, saímos da Barra Falsa pela costa protegidos do mar e vento até perto do farol do Estreito, ai sim fizemos rumo do mangrulho ou melhor os pedaços do que foi o farol. Peguei o canal dos Antigos Veleiros fazendo o canal do Inhâme e ponta do mato na Várzea. Quando saímos do Canal da Várzea para o Canal das Capivaras, ai sim enroscou de vez muito vento, mas consegui manter a mestra em cima e puxar para a costa da Ponta Rasa, onde mesmo pertinho tinha bastante onda e muito vento. Chegamos nas Capivaras ao anoitecer e ficamos na salguinha de sempre. Ligamos para casa dando a nossa posição e a Tete disse que teríamos até o meio dia para chegar a Rio Grande, depois iria puxar de sudoeste e sul. Estávamos apenas quinze milhas de Rio Grande tudo bem, só que teriamos uma noite com muitos ventos de lesnordeste e chuva .Ali é um bom abrigo para ventos destes quadrantes, então a única coisa que tivemos que fazer foi levantar as quatro da manhã para mudar de um lado do cais para o outro... pois rondou para nordeste ai ficou melhor do lado da revessa.
Na quinta de manhã levantamos e tomamos um bom café para última etapa, chovia um pouquinho mas em seguida parou. Dai abriu um sol para iluminar nossa chegada, barco rendendo bem em popa e foi um abraço.Às onze e trinta horas chegamos no Rio Grande Yate Clube inteiros,felizes e realizados por mais uma aventura, as mulheres nos esperando com um sorriso no rosto pois sabiam que em todo o trajeto não quebramos um parafuso que fosse, nem tivemos alguma dificuldade. A gente vai aprendendo dia a dia seja qual for o tamanho do barco em que velejamos e com apoio de terra na previsão tudo fica mais fácil .E assim foi a velejada do marrequinho na lagoa ,e obrigado ao comandante Octaviano por me proporcionar esse belo passeio de inverno e parabenizálo pela ótima aquisição, e quando queira estamos pronto para mais uma dessas aventuras.
Bons ventos a todos navegadores em especial desses barcos marinheiros .
(mais fotos em http://newtonribeiro.webs.com/velejadapoarg.htm )

sábado, 20 de agosto de 2011

Veleiros na Lagoa da Conceição


A Lagoa da Conceição, inscrustada dentro da Ilha de Florianópolis, é um recanto de rara beleza. E este encanto se acentua quando os veleiros que ali se abrigam, predominantemente Oday e Bruma (foto abaixo) saem a navegar. Quem tem feito a reportagem desta atividade, principalmente regatas, é a Kriz mantendo um interessante trabalho de divulgação.
.

Regata de Botes Baleeiros de Açores

Por intermédio de João Carlos Fraga, de Açores, fico sabendo da admirável Regata de Botes Baleeiros , a vela e a remos, realizada durante a Semana do Mar. Este ano a regata teve a participação de 13 botes (8 do Faial e 5 do Pico ). Segundo João Carlos Fraga, a versão açoriana destas embarcações não tem tábua de bolina, só tem quilha. Na adaptação que o modelo norte-americano sofreu, a tábua de bolina foi sacrificada para conferir mais rigidez aos botes que, entretanto, são um bocado mais compridos e esguios do que os originais. Especial atenção merece a participação, muito ativa, de tripulantes femininas. As provas são também muito acirradas, em parte talvez até por conta da rivalidade entre as ilhas. Jocosamente Fraga menciona que "quase que há murro em certas provas". Um belo exemplo da rica contribuição que as embarcações de trabalho podem trazer para a vela. As imagens, inspiradas, são do excelente fotógrafo açoriano Souto Gonçalves.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Barra Limpa ( Relato de Tau Golin)



Na última quinzena de julho, aproveitei o nível alto das águas para navegar de Porto Alegre a Palmares do Sul. Durante muito tempo, no século XX, o trajeto constituiu a primeira parte de um roteiro interessante. Um vapor saia da capital pelo Guaíba, passava o farol de Itapuã, entrando na lagoa dos Patos, contornava a ponta das Desertas, penetrava na lagoa do Casamento, ingressava na barra do rio Palmares e subia até a vila/cidade.

Naquela costa existia considerável empório. Um trem levava os passageiros e cargas até Osório. Ali, um porto conectava, através de lagoas e canais, a Torres. Com o auxílio do trem se navegava a costa por dentro do continente. Dragas mantinham a profundidade para a navegação mais pesada. Este sistema foi destruído há algumas décadas. O trem foi desativado. As dragas retiradas. Sobre os canais construíram pontes sem respeitar altura de vão para a passagem de barcos. Se ainda fosse patrimônio rio-grandense, não se precisaria de cérebro privilegiado para perceber a multiplicidade de seu uso; o turismo, por exemplo, estaria em festa.

Do porto de Palmares também ocorria o fluxo de pessoas e mercadorias pela costa litorânea para o Sul.

O trajeto de Porto Alegre a Palmares do Sul, aparentemente livre da especulação rodoviária, também foi abandonado. Inclusive a “navegação de recreio” é impossível. A causa poderia ser atribuída a falta de visão e a incompetência que deixaram à “natureza” três pontos de bloqueios: o banco do Abreu, o canal do Furado e o assoreamento da barra do rio Palmares. No verão, o calado fica em torno de um metro de profundidade. No inverno, aumenta um pouco. Neste julho de enchente, passamos com 1.90m. De qualquer forma, são trechos muito pequenos, de fundo de areia, nada que um trator sobre flutuante não solucione.

A situação de Palmares do Sul é similar a Itapuã, a Arambaré, a Barra do Ribeiro, etc. A lista é imensa. A situação de São Lourenço é exemplar. Desde a enchente que submeteu a cidade a uma tragédia, os entulhos assorearam a barra. Está com menos de um metro. Se ninguém sai, ninguém entra – pescadores artesanais, barcos de turismo e navegadores que visitavam a cidade, ou que tinham ali importante refúgio. Algo deverá acontecer também em Itapuã, em Viamão. Sua barra e entrada do rio formaram uma elevação. Caso se produza condições peculiares no tempo, aquela comunidade poderá sofrer igual problema.

O fato é que há um século o homem vem assoreando o Guaíba e a lagoa dos Patos. O mais visível é que, nas enchentes, porcos do Planalto Médio ofertam churrasquinho extra no Lami. Mas a cada chuva, toneladas de entulhos vão para o seu leito, carregados pelos grandes rios e riachos. Aquilo que é carregado pelos grandes rios precisa de remoção posterior, mas grande parte da imundície das sangas poderiam ser contidos com mecanismos simples. Mas os técnicos do Rio Grande jamais ouviram falar de sistemas de caçambas com reduções mecânicas, usados desde a Mesopotâmia e povos da Antiguidade; dos egípcios aos incas, etc. Boias de contenção deve ser algo muito complexo para se colocar nas bocas de despejos.

Entretanto, nossos sofisticados técnicos são capazes de projetar braços automatizados, em especial se depender de financiamento internacional para ser implementado. O que esperar de um serviço público que não conseguiu ainda eliminar as poças do Parque da Redenção? Um taipeiro da fronteira, com uma única pá de corte, já teria solucionado o problema.

Enquanto isso, tudo chega no pobre e moribundo Guaíba. Onde crava espontaneamente um pau ou taquareira, novo banco se forma ou aumentam os existentes. A realidade é que o rio está quase inviável à navegação. O que o homem e a natureza jogam para dentro, ninguém tira. Avançaram sobre seu leito pela margem leste; entulharam seu fundo, levantando-o. Aos poucos, obras vão eliminando seu “escape” pelo oeste. Mas o volume de água continua considerável, inclusive chegando ao seu leito em maior volume, acelerado pela pavimentação, desmatamento e todas as condições fartamente conhecidas. Senhores, levantem e aumentem o Muro da Mauá… A natureza é previsível!

No geral, nossos imensos espaços aquáticos são vítimas de políticos de pouca visão e de funcionários ineptos Graça uma doutrina de que a natureza é intocável. É o criacionismo da preguiça! A ciência demonstra que a natureza pode ser melhorada pelo homem. A tese da regeneração espontânea só tem destruído o Guaíba e a lagoa dos Patos. O que falta é, no mínimo, o governo estabelecer uma política de contenção dos fluxos de entulhos e remoção dos assoreamentos, além de implementar canais de navegação. O mais impressionante dessa estupidez: dragas que mantém o canal de navegação para navios, em especial na lagoa, não podem remover “para fora” os sedimentos; são obrigadas a espalhá-los nas partes mais fundas. Dá para acreditar?

Desde o século XVIII, se formou considerável acervo de cartas náuticas, com muitas informações, a exemplo das profundidades. Poderiam servir de parâmetros para uma política de salvamento. Parece evidente que, emergencialmente, o núcleo do poder deveria contar com uma espécie de gabinete das águas para assessorá-lo. Todo mundo apita sobre as águas, os cruzamentos e sobreposições de (ir)responsabilidades são incontáveis. A diversidade sem um centro organizador conduz à imobilidade. Um gabinete, ou grupo de trabalho, ao menos poderia iniciar os trabalhos para elaborar um “código” (ou incluindo como parte de algum existente), reunindo a legislação difusa e normas esparsas, sistematizando todas as atividades. Diante do caos das águas do Rio Grande urge que alguém assuma uma concepção de totalidade e se encarregue, de fato, da fiscalização. Onde não for sua responsabilidade e o serviço estiver acéfalo, que o faça sob autorização de convênios, em especial no meio ambiente, pesca, obras e navegação. A Companhia Ambiental da BM parece ser o órgão mais próximo da tarefa por estar presente em todo território.

No entanto, seria ridículo que mais um gabinete de trabalho postergasse as medidas emergenciais. Dentre elas, a de declarar como política de Estado a limpeza de todas as barras das cidades e vilas com vocação náutica. Voltar a situação do século XIX para ter algum parâmetro e não ficar no achismo dos discursos de preservação. Milhares de embarcações, talvez, assim tenham aonde ir. E não se precise de uma cheia para entrar na lagoa do Casamento e ir a foz do rio Palmares, águas que Garibaldi navegou para embarcar os lanchões nos carretões e levá-los até o Atlântico.

As barras limpas abrem a possibilidade dos rio-grandenses se encontrarem com a sua história. Sairmos da vexatória situação de termos um complexo exuberante de águas (Jacuí, Guaíba, lagoas dos Patos e Mirim, etc.) sem portos e sem espaços para navegar. Restam as fotos do pôr do sol…